sábado, 23 de outubro de 2010

Indiferença

            Passava da meia-noite. O trânsito já não era tão intenso nas ruas, ouvia-se, em intervalos espaçados, o barulho dos carros. As luzes dos postes brilhavam solitárias, iluminando as calçadas vazias. Ninguém ia nem vinha. Dentro do prédio o porteiro cochilava em sua poltrona, os corredores permaneciam escuros, poucos eram os apartamentos do qual vinha algum som, e menos ainda eram as janelas iluminadas.
            Um tiro.
            As pessoas despertaram, as luzes se acenderam, portas se abriram. Os corredores ficaram movimentados, ecoavam vozes e passos. As sirenes quebravam o silêncio das ruas e os postes não estavam mais sós.
            Entretanto, ele continuava lá, deitado no chão da cobertura. Sob o céu estrelado, a luz da Lua iluminava seu rosto, seus olhos. Ele não se abalara com o estouro e não se incomodara com o alvoroço, parecia indiferente. Não lhe importavam as pessoas, não lhe importava o tudo ou o nada, não lhe importava a vida ou a morte. Apenas ficara ali.
            Os passos aumentavam, as falas se intensificavam e as sirenes se aproximavam. A calma dera lugar à dúvida, e a dúvida ao desespero.
            Num movimento brusco a porta às suas costas se abriu. Olhares assustado miraram-lhe. Pessoas correram na sua direção.
            Pela primeira vez lhe davam atenção, lhe questionavam sobre o que sentia, pela primeira vez lhe olhavam com alguma emoção. Pela primeira vez se sentira importante pra alguém. Tudo o que esperara durante toda sua vida acontecia naquele exato momento, mas agora era tarde demais.
            A arma que ele trazia nas mãos já havia feito e seu disparo, já sangrava-lhe o peito. O seu corpo tremia, ele sentia frio, suas vistas começavam a escurecer e suas forças se esvaíam. Porém, ainda que sentisse o sangue na garganta, ele esboçou um sorriso e com a voz fraca e trêmula pronunciou suas palavras finais:
            - A solidão, agora, já não dói mais...

Fim

2 comentários:

  1. Muito bom Durt. Uma mistura de períodos literários. Ora, Modernismo, ora Realismo, ora Ultrarromantismo e, apesar de pouco, um goticismo levante. Continue assim, meu caro.

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  2. Ednaldo, valeu mesmo!
    Acho que essa mistura se deve ao fato de eu estar estudando literatura pro vestibular. E como estou dando uma passada por todas as escolas literárias, talvez eu esteja absorvendo um pouco de cada uma delas.

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