sábado, 14 de agosto de 2010

Melancolia

            Eram dez horas da manhã, ele acabava de acordar. Abriu os olhos ainda sonolento e então observou os poucos raios de sol que adentravam as frestas da janela do quarto. Era um novo dia, trazia novas oportunidades e expectativas, mas, para ele, era somente um sábado como todos os outros.
            Virou-se de lado e viu que estava vazio o lugar de sua mulher. Ela teria, provavelmente, despertado havia algum tempo. Ele se levantou e foi até o banheiro. Não acendeu as luzes, a penumbra era suficiente, ao menos assim ele seria poupado de encarar o seu olhar vazio.
        Lavou o rosto e voltou para o quarto. Desejou estar ali sozinho quanto tempo fosse possível. Estar naquele lugar que seria só seu, onde ele poderia libertar os seus mais obscuros sentimentos. Porém, o silêncio se quebrou com o ranger das dobradiças da porta.
            – Bom dia, meu amor! – disse-lhe a esposa animada e com um belo sorriso nos lábios.
            – Bom dia! – respondeu ele, seco, porém gentil, sorrindo um sorriso amarelo.
            Ele fitou-a nos olhos por alguns instantes. Um olhar tão profundo que poderia penetrar a alma. Então ele aproximou-se dela e a tomou nos braços. Tocou seu rosto ao dela e disse algo que há muito ele não falava:
             Eu te amo!
            Ela sentiu uma chama arder dentro dela, depois sorriu. Ele a beijou. Um beijo como ela jamais havia sentido. Ele tocara os lábios dela como se fosse a última vez que os sentiria junto aos seus.
            Com um olhar frio ele deixou que os seus dedos deslizassem pelo ventre da mulher até que se afastassem dele e atravessou a porta do quarto.
          Ao sair ele foi tocado pelos raios de sol que iluminavam o corredor. Aquilo o incomodara. Ele fechou os olhos e desejou novamente estar no escuro dos seus aposentos, onde ninguém pudesse lhe encontrar. Passou as mãos no rosto para não se perder novamente em pensamentos e desceu até a cozinha. Pegou uma xícara de café e bebeu. Aquele aroma amargo e frio lhe pareceu o mais doce mel.
            Olhou para a varanda e viu o filho. Ele parecia feliz brincando sorridente ao sol. Mas aquela imagem não foi capaz de despertar no homem o menor sentimento. Ele apenas deixou a xícara sobre a mesa e voltou até o quarto. Trocou de roupas e saiu.
            Enquanto andava em direção à porta de saída sua mulher lhe perguntou:
            – O que houve? Aonde você vai?
            – Houve alguns problemas na firma essa semana. Me encarreguei de conferir as contas. Devo me demorar. Portanto, não me espere pro almoço ou sequer pro jantar. Eu como algo na rua.
            Ela só pode ver a imagem dele, de costas, deixando a casa.
            No quintal ele abraçou o filho e beijou-lhe a face. Foi um abraço apertado e um beijo tão doce que fez o menino sorrir.
            – Eu te amo, papai!
            – Também te amo, meu filho!
            Ele foi até a garagem, entrou no carro e saiu. Rodou por horas, sem rumo. Pensou, refletiu, mas não chegou a nenhuma conclusão. Parou num bar, mas não num bar onde costumava ir, num outro qualquer, longe, onde tinha certeza que não veria ninguém conhecido.
            Lá ele entrou e se sentou numa mesa ao fundo, isolada. Não queria falar com ninguém; não queria ver ninguém. Tudo que ele queria era um momento para estar só consigo mesmo. Pediu uma garrafa de uísque e um copo. Ficou lá até terminar a última dose da garrafa. Ao sair pagou pela bebida mais do que ela custava e não deu a mínima quando o dono do recinto tentou lhe falar. Apenas saiu.
            Deixou o carro na porta do estabelecimento e saiu para caminhar. Não sabia para onde ir ou sequer onde queria chegar. Ele apenas andou.
            Vagou por horas até o entardecer. Quando o sol estava quase posto ele viu uma construção. Devia ser um prédio de uns quatorze ou quinze andares.
            Vou subir, pensou ele.
            Lá ele estaria só e de brinde teria uma bela vista. Subiu. Olhou para a cidade, onde começavam a se acender as primeiras luzes. Olhou então para o céu. Tentou falar com seu Deus, mas, como de costume, Ele não lhe respondeu. Ele então pensou naquela vida sem sentido. Começou a sorrir e gargalhar, zombava de tudo que vivera até ali.
            Subiu no parapeito e começou a dançar e rodopiar. Viver não fazia mais diferença, e num passo em falso ele viu seu corpo deslizar no ar.

Fim

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